Francisco, El Hombre incendeia Circo Voador

O rock sempre foi um estilo musical baseado na contestação, que costumava ser chamada de "rebeldia" pelas gerações mais velhas. Na noite da última sexta-feira, o Circo Voador recebeu um grupo de atrações que representa a rebeldia no melhor sentido da palavra, com apresentações do espetáculo Insônias, Mulamba e Francisco, El Hombre.

Não apenas questionamentos, a noite também trouxe muito empoderamento e representatividade. O Espetáculo Insônias abriu o evento com uma apresentação teatral e circense repleta de mensagens em prol das mulheres, além de uma crítica forte à recriminação do uso da maconha. Em um ato ousado de rebeldia, o grupo chegou a acender um baseado e passar para o público, na clara mensagem de "não temos nada a esconder".
O Mulamba subiu ao palco em seguida, e que delícia de apresentação! Infelizmente ainda é raro ver mulheres com tanta força e chega a ser injusto precisarmos chamar de "coragem" algo que deveria ser comum. É injusto que um grupo de mulheres precise ter coragem para fazer o que homens fazem o tempo todo. É por isso que talvez eu ache que "coragem" nem seja a palavra correta para usarmos aqui. Enquanto o Mulamba estava no palco, eu tive a oportunidade de ver o que é de fato quando mulheres se sentem no poder. Donas de suas vozes, de suas roupas, de suas letras e de seu corpo, a naturalidade delas em relação a tudo que normalmente nos oprime me fez sentir um pouco mais poderosa também.
Falar da Francisco, El Hombre é falar da América Latina. O ritmo animado e dançante não reduz em nada o teor político de suas letras, representando a capacidade do nosso povo de lutar sem perder o otimismo. Em uma noite dedicada ao poder feminino, a Francisco convidou um time de mulheres para participar do show ao lado de Juliana Strassacapa, única representante do gênero no grupo. A questão da identidade de gênero também foi alfinetada pela banda ao convidar Assucena Assucena e Raquel Virgínia para o palco, ambas mulheres transsexuais. Clarice Falcão, a queridinha do público carioca, também participou do show.

A apresentação seguiu com o bloco Calor da Rua, da própria Francisco, El Hombre, que transformou o Circo Voador em algo semelhante às ruas da Lapa em pleno Carnaval. As convidadas retornaram ao palco para uma nova versão de "Triste, Louca ou Má", música que já em seu próprio título critica o silenciamento das mulheres. Foi entregue aí a gota que faltava para transbordar o copo de feminismo com o qual a noite foi regada.
A sociedade como um todo ainda tem muito a aprender e evoluir. Nós, como mulheres, temos um compromisso de união e informação para nos livrarmos cada dia mais de todas as amarras que nos prendem a conceitos ultrapassados e agressivos. O sabor de eventos como este é doce demais no meio de tanto amargo, mas ele não pode ser o objetivo nem o ponto final da luta. Ver uma banda como a Francisco, El Hombre protagonizar a noite me fez levantar vários questionamentos, que geraram uma imensa pesquisa e algumas conclusões. A banda, que esteve envolvida em uma grave denúncia de machismo por parte de um de seus integrantes, ergueu uma bandeira e decidiu lutar por ela agregando várias pessoas com foco no mesmo ideal. O posicionamento de não se abater, não desistir e, em vez disso, aprender e evoluir com o erro é algo que deve ser levado para o dia-a-dia de todos nós.

Vamos todos errar, aprender e nos levantar. Vamos erguer nossas bandeiras e lutar pelas coisas que sabemos e acreditamos. Vamos usar a música como arma para não sermos silenciadas. Vamos tirar a roupa, pintar o peito e a cara, vamos berrar nossas verdades e viver segundo elas. Vamos dar força a quem se sente fraco. Vamos nos empoderar.

Vamos evoluir.

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